domingo, 2 de janeiro de 2011

O VIOLINO QUE PAROU DE TOCAR

foto: Roselena Landenberger

    Havia um violino que vivia tocando belas melodias. Amava reunir-se com seus amigos para juntos descobrirem novos sons, experimentarem novas harmonias. Aos domingos iam ao parque e juntavam-se a um grupo de cantores que se deliciavam com o som das cordas e dos sopros acrescido ao seu canto. Um dia, juntou-se ao grupo uma frequentadora que não sabia cantar. Ela não cantava porque vivia numa dimensão onde os sons não eram captados, e como ela não os podia perceber não tinha como reproduzi-los com sua voz. Sentava-se silenciosamente ao lado do violino e ficava observando, alheia a todos os sons. O violino sentiu-se profundamente tocado pela presença daquela senhora idosa que nunca poderia experimentar as alegrias e emoções de uma peça musical. A música para ele era a própria vida. Como poderia respirar se lhe fosse tirada a capacidade de usufruir deste elemento vital?
    Aquilo ficou martelando nas suas cordas como um pizzicato contínuo. Alguma coisa tinha que ser feita. Conversou com alguns amigos sondando a possibilidade de alguém vir a fazer algo pela nova amiga, pois ele estava sempre tão ocupado estudando novos sons. Mas ela não lhe saía do pensamento. Às vezes chorava sozinho pensando em como seria doloroso viver naquela dimensão silenciosa, e enquanto as lágrimas vertiam em sua alma suas melodias foram se transformando de "adagio com expressão (lamento)" em "andante com moto". Percebeu então que sua nova amiga não podia cantar, mas podia dançar.
    Aos poucos foi ganhando braços e mãos com mil possibilidades de movimentos. Em seguida ganhou pernas e pés para poder se locomover mais facilmente. Ocorreu-lhe que podia aprender a dançar e matriculou-se num curso de dança. Conheceu uma comunidade inteira que vivia na mesma dimensão que sua amiga do parque e entusiasmou-se a tal ponto que perdeu a noção do tempo. Enquanto aprendia um sem número de passos novos, a vida desvendava alguns dos mistérios de sua própria alma.
    Dançou tanto tempo mergulhado em silêncio que se esqueceu das antigas melodias... Até que um dia descobriu que estava em plena transformação. Sempre estivera, mas não havia se dado conta da extensão de tal fenômeno, até descobrir que suas antigas cordas, já um pouco enferrujadas pelo desuso haviam se multiplicado... Magia... Seu arco transformara-se em 88 pequeninos martelos. Seu corpo de madeira foi se esticando numa impressionante metamorfose... O violino se transformara num elegante piano de cauda. No fundo, era o que sempre sonhara...
    Depois deste fato curioso, aconteceu que o antigo Violino descobriu que tinha afinidades também com outros teclados e começou a dedilhar as teclas do seu computador para tentar escrever pensamentos e registrar impressões...
    Que outras surpresas a vida não lhe trará?
Roselena Landenberger

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