domingo, 1 de agosto de 2010

RENDIÇÃO



       Mais um meio do que um fim.

 
     Já pensou nisso?

      A arte, a música, a poesia, a vida, tudo se resume em Deus. Tudo nasce, cresce e morre em Deus, por Deus e para Deus.

     Já pensou no que isso pode significar? A música que você toca hoje é um meio e não um fim. Ela pode ser um simples entretenimento ou um derramar de alegria, pode ser um lamento ou um suspiro da alma, pode ser um cântico de celebração cheio de vida ou um réquiem fúnebre e sombrio. Ela pode ser cantada e jamais ouvida, nem mesmo pelos seus próprios ouvidos. Pode ser que seja única, perdida no tempo e no espaço, um bebê natimorto, ou um jardim de rosas em explosão de cores de graciosidade etérea e efêmera. Hoje floresce, amanhã fenece. Como a curvatura de uma ligadura exposta numa partitura. Um crescendo paulatino que atinge o seu apogeu e suavemente declina-se no poente.

      Quantas vidas você tocou por causa daquela canção que elevou seu coração a Deus naquele cantinho só seu, a portas fechadas, no quarto mais escondido da sua alma?
Quantos sorrisos você repartiu por causa daquele acorde que encadeou-se com aquele outro, aos quais se juntou mais um som novo na arquitetura leve, graciosa e sensível, sonora e festiva, doce teia de harmonia poética entre sons agregados e dispersos, dançantes e reluzentes, macios e contrastantes, duros e dissonantes?

       Quantas lágrimas você já chorou na solidão aos pés de quem tudo criou, sem nada para ocultar a alma nua e crua, enquanto seus dedos percorriam teclas e sua alma procurava um som que a traduzisse até calar-se na exaustão, dizendo:”Basta!”? E nesse ato de rendição o Criador, ele mesmo, vem aperfeiçoar a obra dele, colocando diante de você um espelho cuja luz machuca os olhos, mas cuja verdade se reflete gloriosa e dolorosamente. “Ai de mim, ai de mim...” E enquanto o Criador chora, as lágrimas dele fundem-se às suas tocando o ser que ele criou até que o ser criado sinta em si mesmo o temor, a perplexidade e a profundidade deste momento pungente e exclame finalmente: “Santo! Santo! Santo!...”


Roselena Landenberger


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